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Cofre
Estimativa
60.000 - 80.000
Sessão 2
29 Maio 2019
Valor de Martelo
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Teca, madrepérola; montagens de prata Índia, Guzarate; e provavelmente Lisboa (montagens)
Séc. XVI (segunda metade)
12x16,5x12 cm
Categoria
Objectos
Informação Adicional
Raro e precioso cofre, de dimensão miniatural, de corpo paralelepipédico e tampa tronco-piramidal de madeira de teca, revestido a mosaico de madrepérola (da concha do gastrópode marinho Turbo marmoratus), cujas tesselas, são fixas à estrutura por largos balmázios de prata. O cofre, assente sobre soco, eleva-se sobre pés dispostos nos cantos. As montagens, em prata gravada, revestem os ângulos formados pelo encontro das arestas inferiores da tampa com as superiores do corpo, consistindo igualmente na fechadura em caixa quadrangular e lingueta, e asa no topo da tampa. A decoração das ferragens, a buril, segue erudito repertório maneirista de rinceaux e ferroneries de meados de Quinhentos. A qualidade das montagens remete para uma oficina de ourives da prata, provavelmente lisboeta, da segunda metade do século XVI. Tanto a forma como toda a decoração das montagens de prata parecem ser versão miniatural de um cofre desta mesma produção (16 x 24,6 x 16,1 cm) que publicamos recentemente (Crespo 2019, pp. 240-243, cat. 30), diferindo apenas na menor capacidade do ourives ao transpor a erudita decoração maneirista para áreas de muito menor dimensão. Isso mesmo se pode observar no lançamento da decoração e no fundo traçado sobre o qual os motivos se destacam menos. É também de notar uma certa desproporção dos elementos argênteos face à dimensão do presente cofre, que resulta no curioso gigantismo dos balmázios que animam a sua superfície iridescente, dos pés e da asa superior, cujo recorte, embora não exactamente igual ao de maiores dimensões, é do mesmo tipo.
A origem indiana desta produção, em concreto de Cambaia e Surat no Guzarate é, desde há cerca de três décadas, plenamente aceite e comprovada, tanto do ponto de vista documental e literário, como pela sobrevivência de estruturas de madeira cobertas por tesselas de madrepérola, caso do baldaquino do túmulo do santo sufi, Sheikh Salim Chisthi (†1572) em Fatehpur Sikri no Uttar Pradesh. Trata-se de uma produção de cariz geométrico e âmbito islâmico, onde por vezes as tesselas de madrepérola desenham complexas composições de escamas ou, à semelhança dos pratos também realizados com a mesma técnica, usando fina chapa de latão e pinos do mesmo metal, de flores-de-lótus estilizadas (veja-se Ferrão 1990, pp. 114-122; Felgueiras 1996; e Sangl 2005). A forma do nosso exemplar, de tampa tronco-piramidal, corresponde, à semelhança de exemplares coevos em tartaruga, a uma tipologia em uso no subcontinente indiano e de âmbito islâmico, anterior à chegada dos primeiros portugueses, herdeira da forma das arquetas utilizadas, séculos antes, para proteger os textos sagrados do Budismo (Crespo 2014, pp. 65-69).
O aspecto mais importante desde pequeno cofre é a rica decoração pintada no interior da tampa, nas paredes e fundo interior (sobre fundo vermelho), junto com os vestígio de decoração no fundo exterior (a verde). Esta decoração, a goma laca misturada com pigmentos de cores vibrantes, inclui lebres e pássaros no interior da tampa e um outro pássaro no fundo interior que, junto com dois que preenchem dois dos lados oblíquos do interior da tampa, podem ser identificados com o bulbul, ave passeriforme que pertence à família dos Pycnotidae, cujo canto era muito apreciado no Guzarate, habitat de algumas espécies nativas. Lançadas a espessa linha de contorno negra, com muita graciosidade e leveza, os animais surgem sobre fundo polvilhado de flores estilizadas que parecem derivar da pintura persa, num estilo reminiscente da pintura indiana sobre papel tal como praticada nalgumas das oficinas de corte menos sofisticadas do sultanato do Guzarate.
Esta decoração, tal como uma arqueta de escrita recentemente publicada, apresenta muitas semelhanças com o muito conhecido Codex Casanatense 1889 - manuscrito onde se representam os costumes e vestuário dos diversos povos asiáticos com os quais os portugueses contactaram -, e que foi recentemente atribuído a uma oficina de um sultanato dos inícios do século X
Leilão Terminado