Leilão 116 Antiguidades e Obras de Arte, Pratas e Jóias

4

Escola holandesa, séc. XVII/XVIII


Estimativa

25.000 - 35.000


Sessão 1

20 Julho 2022



Descrição

Natureza morta
Óleo sobre madeira

41,5x32 cm


Categoria

Pintura


Informação Adicional

Proveniência: Colecção Conde do Ameal
Figurou no leilão realizado no ano de 1921, onde surge catalogado como lote número 1096


A COLECÇÃO DE ARTE DO 1º CONDE DO AMEAL - “ARS SUPER OMNIA” (ARTE ACIMA DE TODAS AS COISAS)

João Maria Correia Aires de Campos (1847-1920) foi um importante político conimbricense que se tornou num dos mais importantes colecionadores de arte do século XIX/XX. Coube a si o papel decisivo na dinamização do mercado de arte contemporâneo nacional, ao adquirir obras de um conjunto considerável de artistas portugueses, muitos deles do seu tempo. Ainda jovem começou por estudar Direito na Universidade de Coimbra (seguindo os passos do seu pai, que ali tinha feito o mesmo curso na década de 1830). Depois de no ano de 1874 ter obtido o bacharelado em direito e no ano de 1875 a licenciatura, juntou-se ao partido Regenerador. No ano de 1876, casou-se com Maria Amélia de Sande Mexia Vieira da Mota (oriunda de uma antiga família latifundiária com tradição nas áreas da magistratura e da academia, sobrinha e única herdeira do 1.º Conde do Juncal), e juntos tiveram quatro filhos. Presidente do Distrito de Coimbra, no ano de 1893 foi eleito autarca da cidade de Coimbra (na altura a terceira maior cidade do país em dimensão e importância), cargo que exerceu até 1895. Durante a década de 1890 também exerceu intermitentemente funções de deputado no Parlamento da Portugal, onde foi membro das comissões parlamentares de Administração Pública (1893 e 1894) do Comércio e Artes (1894) e da Estatística (1897). A par disso, a destacada actividade política, social e cultural que desenvolveu valeu-lhe algumas das mais importantes condecorações como a Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo, a Comenda da Ordem Real da Imaculada Conceição de Vila Viçosa e as Palmas de Ouro e Prata da Ordre des Palmes Académiques de França. Ao retirar-se da vida política, no ano de 1901, foi nomeado pelo Rei D. Carlos I, 1º Conde de Ameal (título que se refere à pequena aldeia nos arredores de Coimbra onde os seus antepassados paternos tinham as suas raízes e casa de família). Na mesma ocasião, o seu filho mais velho - político e diplomata ao serviço do Ministério das Relações Exteriores de Venceslau de Lima - recebeu o título de cortesia de 1º Visconde de Ameal. Para embelezar o seu brasão escolheu o lema Ars Super Omnia ("Arte Acima de Todas as Coisas").

A COLECÇÃO DE ARTE

O futuro Conde do Ameal, terá herdado no ano de 1885 do seu pai uma considerável coleção de manuscritos e de livros impressos antigos, que o tornaram detentor de uma das mais notáveis bibliotecas privadas existentes em Portugal. Herdou, também, algumas antiguidades e objetos artísticos, que foram a base da distinta coleção de arte que veio a constituir nas décadas seguintes e que acabou por engrandecer, até atingir o estatuto de uma das mais importantes coleções privadas do seu tempo. Apesar do ecletismo que se identifica na sua coleção, não o podemos caracterizar como um colecionador que o fez somente por transmissão a uma moda ou pela exaltação de grandezas. Na Gazeta de Coimbra o seu perfil é retratado com as seguintes palavras: “Não era o interesse snob de querer obras d’arte para os outros. Tinha-as para si, muito para si, para o sentimento de artista e para a sua emotividade intelectual, e, só, muitas vezes ia viver com elas, acariciá-las, senti-las, naquele ambiente agradável das salas do seu palácio”. No ano de 1892 adquiriu os edifícios do século XVI do antigo convento e colégio de São Tomás, e transformou-os numa vasta residência. Ao longo dos anos seguintes, os seus quartos, vários dos quais ainda na sua forma gótica original, apesar do exterior clássico e sóbrio do edifício, foram preenchidos com móveis preciosos, pinturas dos antigos mestres e cerca de 30.000 livros raros. É através do catálogo do leilão realizado em julho de 1921 que ficamos a conhecer o gosto deste colecionador e o recheio que à data preenchia, os 14 salões (identificados no catálogo de A a N) e no belo claustro renascentista daquela residência. Naquele edifício estava um acervo de cerca de 2500 peças. Entre pinturas, esculturas, mobiliário, destacam-se as porcelanas, faianças, azulejos, desenhos, aguarelas, gravuras, instrumentos musicais, bronzes artísticos, pratas, frontais de altar, marfins - servindo de exemplo a placa esculpida com cena mitológica que já esteve em leilão nestas mesmas salas (Lote 657 do leilão 107), esmaltes, cristais e vidros de Veneza. Desta colecção de pinturas, que no seu auge somava mais de 600 peças, compreendia uma tela representando São João Baptista então atribuída a Caravaggio, um grande desenho representando a Cabeça de um Homem da autoria de Rembrandt, um grande Glorificação da Virgem pintada por Peter Paul Rubens, O Paraíso Terrestre de Jan Brueghel e dois retratos de santos por Zurbarán. A coleção continha ainda duas telas de Murillo, três de Greuze, quatro de Ribera e uma tela e quatro gravuras de Goya, além de uma grande coleção de aguarelas de Turner e de Delacroix. Embora as grandes escolas internacionais estivessem representadas, através de nomes como Dürer, Velázquez, Rembrandt, Bartholozzi, também os artistas nacionais se encontravam representados com trabalhos de artistas como Pedro Alexandrino, Cyrillo Wolkmar Machado, do rei D. Fernando II, de Tomás da Anunciação, entre tantos outros. Admirador dos pintores portugueses contemporâneos, em particular da escola realista então no auge da sua popularidade, também possuía uma vasta seleção de telas e desenhos de artistas como José Malhoa, Columbano e António Silva Porto. Destes últimos, possuía o famoso “O Menino e as Suas Ovelhas”, agora no Museu Nacional Soares dos Reis, no Porto. No final da sua vida, o Conde chegou a reunir uma vasta colecção de escultura e pintura gótica, bem como de pintura religiosa portuguesa do final da Idade Média e da Idade Moderna que adquirira sobretudo após a supressão da propriedade das ordens religiosas em 1910. Outras peças importantes da sua coleção dizem respeito às porcelanas e às faianças islâmicas, maioritariamente ibéricas e tardomedievais, que totalizavam cerca de 800 peças. Com a sua morte, em 1920, a viúva e os herdeiros decidiram vender a maior parte da coleção, e doar o palácio que a abrigava a uma ordem religiosa. Para o efeito, foi organizado às pressas um grande leilão em Julho de 1921. Considerado como um dos maiores eventos do género na história do mercado de arte de Portugal, que Norberto de Araújo classificou como “o acontecimento ligado á Arte mais curioso e emocionante do último século”, o mesmo pode ser confrontado com dois grandes leilões que o antecederam. Um realizado em 1893 em torno dos bens do Rei D. Fernando II, e um outro concretizado no ano de 1901 com a colecção do Conde da Foz. Posteriormente, o panorama do mercado de arte português viria a assistir à realização no ano de 1936 do leilão da coleção do banqueiro Burnay, e em 1946 o leilão do recheio do palácio de Monserrate. Dos 2019 lotes que compunham o exaustivo levantamento efetuado no ano de 1921 pela “Empresa de Móveis Lda”, que resultou num catálogo de 120 páginas, redigido em francês, ilustrado com 100 fotografias (da autoria do fotógrafo de Coimbra Milton Bartholo) e com algumas vinhetas de peças e de rostos de artistas, o quadro que agora trazemos a leilão diz respeito ao lote nº 1096, que era descrito da seguinte maneira “Tableau à l’huille sur bois “Nature mort”. École hollandaise, Van Huyssen.”. Atraves deste catálogo ficamos a saber que esta pintura se encontrava na sala I.

TIAGO FRANCO RODRIGUES

Literature: Vente d’ objects d’art. Collections “Comte de Ameal”. Catalogue descriptif. Lisboa: Offic ”Illustração portuguesa”, 1921 Conde do Ameal. O seu falecimento”, Gazeta de Coimbra, 15.07.1920 Clara Moura Soares, "A Coleção de arte do Conde do Ameal: o leilão de 1921 e as aquisições do Estado Português para os Museus Nacionais" in Coleções de Arte em Portugal e no Brasil nos séculos XIX e XX. Modos de ver e exibir em Brasil e Portugal, Rio de Janeiro, Rio Books, 2016 pp. 89-105



Leilão Terminado